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Ao longo da pesquisa, levantou-se a possibilidade de realização de uma terceira etapa de pesquisa - além do questionário e da documentação audiovisual de entrevistas - que permitisse acompanhar um grupo menor de jovens, três participantes, em seus percursos cotidianos. O objetivo era conhecer e registrar aspectos significativos de suas vidas narrados nas entrevistas. Novas estratégias e instrumentos de pesquisa foram utilizados extrapolando, assim, os planos inicialmente traçados no projeto.

 

O que se pretendia era aprofundar as possibilidades de reflexão dos entrevistados em torno de suas trajetórias de vida, das provas enfrentadas e dos suportes acionados por estes jovens no sentido da superação dessas provas. Com este intuito, lançou-se mão de dois dispositivos metodológicos que permitiram que os jovens produzissem imagens de si e sobre si, ou seja, registros deles próprios em suas ações cotidianas e de representações sobre o passado vivido e suas projeções para o futuro.

 

O primeiro dispositivo foi fotográfico. Cada um dos três jovens participantes desta etapa da pesquisa recebeu, sob empréstimo, uma máquina fotográfica digital. Um membro da equipe explicou a proposta, os objetivos enquanto tudo era novamente registrado em áudio e vídeo. O dispositivo foi tratado como um “desafio ou tarefa fotográfica” em torno de duas perguntas: a) sua vida poderia ser fotografada? b) o que você fotografaria? Sugeriu-se, com estas questões, um exercício projetivo de fotografias que poderiam ser feitas e assim os jovens foram descrevendo espaços concretos de seus cotidianos, mas também imagens menos concretas que poderiam representar experiências, acontecimentos, sentimentos, projeções, expectativas de futuro. Após uma breve explicação sobre funcionamento e funcionalidades da máquina e possíveis enquadramentos para as fotos os jovens receberam uma cartela para o registro das fotos escolhidas. Em tempos de máquinas digitais, é possível registrar um sem número de fotografias, contudo, o principal da tarefa de reflexão sobre si recai sobre a escolha das fotos, daquelas que melhor representam aquilo que se pretende mostrar. Neste sentido, os jovens poderiam registrar quantas fotos quisessem, mas deveriam escolher entre 15 e 18 fotos para serem apresentadas à equipe de pesquisa em novo encontro marcado com 2 a 4 semanas de intervalo após este primeiro encontro.

 

“Uma imagem vale mais que mil palavras” já virou um jargão mas não é necessariamente uma verdade estética ou científica. Muito daquilo que se vê em uma imagem expressa, além das intenções e os acasos significativos de seu produtor, também as experiências, sentimentos, conhecimentos e pré-noções de quem olha.

 

Neste sentido, o retorno das fotos para uma nova conversa sobre elas era fundamental para se compreender o que e porquê os jovens haviam feito e escolhido os registros fotográficos apresentados. Neste processo de retorno da produção realizada a partir do dispositivo fotográfico, muitos temas já abordados nas entrevistas foram retomados com novos conteúdos e interpretações alternativas dos jovens sobre suas próprias experiências e trajetórias de vida. Houve temas repetidos e em alguns casos poucos elementos novos foram acrescentados além daquilo que emergirá e havia sido registrado nas entrevistas, mas em outros, o processo reflexivo ficou bastante evidente na medida em que os novos olhares dos jovens sobre si haviam sido produzidos a partir do registro e olhar das imagens produzidas.

 

Um segundo dispositivo, o de vídeo, foi introduzido com o uso da mesma máquina digital entregue aos jovens – para dois deles de maneira subsequente e para um deles simultaneamente em função das disponibilidades de cada um para o intervalo de produção das imagens. Com o dispositivo de vídeo esperava-se dar continuidade ao processo autorreflexivo dos jovens e também obter registros de imagens que poderiam ser usadas no vídeo documentário e que dificilmente poderiam ser registradas por uma equipe de filmagem sem que isto tivesse significativa interferência na situação registrada.

 

Ao comparar as produções e retornos dos dois dispositivos, foi possível observar o melhor resultado em termos de processo autorreflexivo, que foi mais expressivo na produção das fotografias do que no dos vídeos. Ainda assim, os vídeos efetivamente produziram imagens significativas para o vídeo documentário, seja em função do olhar peculiar de cada jovem sobre suas realidades, seja pela preservação da cena vivida sem a interferência da equipe de pesquisa ou mesmo pela exclusiva interferência do jovem, produzindo imagens de sua vida da maneira que melhor gostaria de vê-la representada.

 

Em síntese, trata-se de indagar em que medida os dispositivos contribuem para a compreensão dos processos de individuação e da mesma forma ativam, na situação de encontro de pesquisa, novos campos de reflexividade e autonomização.


Saiba mais sobre a pesquisa Jovens Fora de Série na página do Observatório Jovem/UFF.

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